O Globo - O impacto das pítons birmanesas invasoras no ecossistema do sul da Flórida preocupa biólogos e especialistas em conservação, que têm observado uma dramática redução na fauna local. Recentemente, pesquisadores constataram que essas cobras são capazes de consumir grandes presas inteiras, como os veados-de-cauda-branca e até crocodilos, o que tem intensificado o desequilíbrio no Parque Nacional Everglades e em áreas adjacentes.
Esses répteis, que podem consumir animais de até 100% de seu próprio peso corporal, representam uma ameaça crescente à diversidade da fauna na região, segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS).
A situação foi evidenciada em dezembro de 2022, quando uma equipe de pesquisadores liderada por Ian Bartoszek, biólogo e coordenador científico da Conservancy of Southwest Florida, encontrou uma píton birmanesa de 4,5 metros de comprimento devorando um veado-de-cauda-branca adulto.
De acordo com Bartoszek, a cobra havia ingerido metade do animal quando a equipe chegou ao local. Ao longo de 30 minutos, os biólogos observaram o réptil completar o processo de alimentação, engolindo o animal completamente.
A cobra, com 52 quilos, conseguira engolir um cervo que pesava cerca de 35 quilos — representando 93% da abertura máxima de sua boca, conforme detalhado em artigo publicado no periódico Reptiles & Amphibians. Bartoszek descreveu a cena como uma das mais impressionantes da sua carreira: “Foi o mais primitivo possível, algo que nunca imaginamos presenciar de forma tão direta em campo.”
O caso, no entanto, é o reflexo de uma presença invasora que causa, segundo o USGS, um “efeito cascata” de extinção de espécies nativas. O órgão estima que a população de guaxinins no Everglades caiu 99,3% desde 1997, e a de gambás diminuiu 98,9%, enquanto a de linces sofreu uma queda de 87,5%. Animais menores, como coelhos-do-pântano e raposas, praticamente desapareceram.
Além disso, necropsias realizadas em pítons birmanesas capturadas na região revelaram vestígios de uma variedade de espécies nativas, incluindo animais protegidos como a cegonha-de-madeira e o rato-de-floresta-de-Key Largo, o que intensifica a preocupação das autoridades locais a respeito da biodiversidade.
Para acompanhar a movimentação e os hábitos das pítons, a equipe de Bartoszek utiliza uma técnica de radiotelemetria e instala rastreadores em pítons machos. Esses dispositivos transmitem sinais de rádio que ajudam os pesquisadores a localizar fêmeas reprodutivas, cruciais para a proliferação da espécie.
“Essa é uma das nossas poucas estratégias para localizar e conter a população reprodutiva de pítons na região”, explicou o biólogo à ABC News.
A Flórida também implementou o programa Python Patrol, administrado pela Comissão de Pesca e Vida Selvagem (FWC), no qual caçadores de recompensas são pagos para capturar pítons, na tentativa de reduzir a população invasora. Em 2021, a espécie foi formalmente adicionada à lista de Espécies Não Nativas Proibidas da Flórida.
Além de sua capacidade de adaptação e reprodução, a forma de caça das pítons também as torna particularmente eficientes e ameaçadoras para as espécies locais. Como grandes constritoras não venenosas, as pítons emboscam suas presas, e se enrolam no corpo das presas até que o animal sofra parada cardíaca, facilitando o processo de deglutição. “Quando você vê a anatomia deles em primeira mão, é impressionante como a Mãe Natureza os equipou para o sucesso predatório”, diz Bartoszek.
No caso presenciado pela equipe, a píton atingiu o cervo na altura do pescoço antes de envolvê-lo para finalizar a captura. Embora a cobra conseguisse sobreviver por uma semana com aquela refeição, ela provavelmente voltaria a caçar rapidamente, pois a espécia é caçadora oportunista. Segundo Bartoszek, as pitons são capazes de esperar semanas ou até meses entre uma refeição e outra, mas, em um ambiente com presas abundantes, como o Everglades, elas tendem a capturar novas presas com frequência.
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