Foi a primeira vez que o Ministério Público Federal utilizou esse tipo de equipamento para produção de provas. Ação aconteceu em Caicó, no Seridó potiguar. Área foi monitorada por um drone do MPF — Foto: Cedida/MPF
G1RN - Pela
primeira vez, o uso de drones pelo Ministério Público Federal (MPF)
possibilitou a produção de provas, que o órgão considerou que foram
cruciais para a comprovação do dano ambiental causado por uma
mineradora. Alvo de uma ação civil pública, a empresa tinha licença para
prospectar minério de ferro na área conhecida como Sítio Serra da Cruz,
localizada em Caicó, no Seridó potiguar. A região recebe turistas de
todo o Brasil e é conhecida pela concentração de cavernas, onde há
pinturas rupestres e rios subterrâneos.
Estudos
realizados por espeleólogos (especialistas em cavernas) do Rio Grande
do Norte indicaram degradação ambiental na área de influência daquelas
cavidades, inclusive com o aumento do aspecto turvo do rio subterrâneo.
Embora a suspeita fosse de dano ambiental decorrente da atividade de
mineração, não existiam meios adequados para comprovar a hipótese.
“Foi
por meio das análises geográficas realizadas com o auxílio do drone que
conseguimos assegurar a existência do dano às cavidades das grutas,
consistentes na supressão da cobertura vegetal e na modificação da
topografia. Foi possível atestar esses danos pela presença de cortes,
aterros e terraplanagem executada para abertura de vias de acesso e
praças de sondagem”, explica a procuradora Maria Clara Lucena,
responsável pela investigação.
Área em Caicó, no Seridó potiguar, foi monitorada por um drone para produção de provas — Foto: Cedida/MPF.
O cruzamento das imagens obtidas pelo drone com outros bancos de dados
demonstrou que a água da chuva poderia ter levado os detritos da
atividade mineradora para o interior da caverna. “O caso de Caicó é
emblemático porque o uso do drone foi essencial para produção da prova
técnica que subsidiou a atuação do MPF. Sem ele, dificilmente a
procuradora conseguiria fortalecer a tese de que a contaminação da bacia
hidrográfica da caverna pode ter sido causada pela atividade de
mineração”, acrescentou Marcelo Pires da Silva, diretor do Centro
Nacional de Perícia do MPF. Ele diz que o MPF adquiriu dois equipamentos em janeiro de 2018, e, em
agosto, foi oferecido treinamento para servidores, que passam a ser
multiplicadores dos conhecimentos adquiridos. “Os procuradores podem
contar com mais essa ferramenta em sua atuação. O uso dos drones elevou a
qualidade do trabalho de perícia”, avalia.
Apesar de a utilização de drones não ser novidade, a abordagem no
âmbito do MPF é inédita. Isso porque a Secretaria de Perícia, Pesquisa e
Análise (Sppea), órgão de apoio científico às investigações, passou a
adotar técnicas de aerolevantamento capazes de fazer medições de
distâncias, áreas e volumes, além da produção de modelos digitais de
relevo que permitem conhecer as variações de altitude na área levantada.
Tudo isso com resolução espacial de 3,5 cm a 8 cm por pixel (imagens do
google earth têm resolução média de 50 cm).
Como funciona
De acordo com o MPF, primeiro um profissional habilitado faz a
delimitação da área a ser trabalhada e, em função dela, estima a altura
do sobrevoo. “Todo o trabalho é feito com o auxílio de um aplicativo por meio do
qual se faz o planejamento de voo. Na medida em que a aeronave se
desloca, ela tira, automaticamente, fotografias da área de interesse,
criando uma imagem em faixas, em que cada fotografia se sobrepõe às
fotografias vizinhas em cerca de 70%. Essa técnica, tradicionalmente
aplicada em aerolevantamentos com aviões, permite a correção geométrica
do conjunto de fotografias, que tipicamente possuem distorções, e,
assim, é possível, por exemplo, fazer o cálculo entre diferentes
pontos”, explica o perito em geologia do MPF Humberto Lima, responsável
pelo trabalho realizado em Caicó, juntamente com o perito em engenharia
florestal Alan Mocochinski.
Em seguida, essas imagens são tratadas em um software para gerar um
mosaico de alta resolução, que é georreferenciado (com coordenadas de
GPS).
Antes do surgimento dos drones, o trabalho de aerolevantamento era
realizado por aviões ou a partir de imagens de satélites. No entanto, a
depender da circunstância da investigação – uma localidade na região
amazônica, por exemplo –, o uso das técnicas tradicionais pode não ser a
mais adequada. “Os serviços com aeronaves tripuladas são extremamente
caros. No caso dos satélites, não há imagens de todos os locais
fiscalizados, o custo para a utilização dos serviços também é alto e
muitas dessas imagens estão desatualizadas”, adverte Humberto Lima. Além da economia de recursos, as aeronaves diminuem o tempo das
perícias e permitem a realização de um trabalho mais seguro para
peritos, pois não é preciso deslocar a equipe até determinadas regiões
marcadas por conflitos (o operador pode guiar o drone a uma distância
segura de 1km), e até mesmo permitir que a equipe realize o levantamento
sem ser notada.
Dois casos recentes também ajudaram procuradores do MPF no combate a
ocupações de áreas protegidas por lei. O primeiro aerolevantamento da
PGR foi feito em Aruanã (GO), em setembro de 2018, nas margens do Rio
Araguaia, numa área de 79 hectares. Na ocasião, foram verificados
loteamentos irregulares nas margens do curso d'água, e foi feito um
levantamento sobre o número de imóveis nas margens do rio, área
construída e portos. Ao todo, 19 propriedades foram vistoriadas. O outro foi o acompanhamento da execução de um termo de ajustamento de
conduta na Vila Varjão, comunidade do Distrito Federal situada em área
de preservação ambiental. O procedimento, realizado em outubro passado,
foi instaurado em razão do descumprimento de cláusulas do acordo que
eram de responsabilidade do Ibama, do Governo do Distrito Federal e da
Terracap. A perícia verificou ocupações irregulares nas três unidades de
conservação distritais que circundam a Vila Varjão: a Área de Relevante
Interesse Ecológico do Torto, o Parque Ecológico do Taquari, e o Parque
Ecológico e Vivencial da Vila Varjão.
Equipe durante trabalho com drone em Caicó — Foto: Cedida/MPF
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